segunda-feira, março 27, 2017

Tabacaria



Lembro-me perfeitamente do momento em que abri uma pequenina edição chamada "Tabacaria".
Foi há muitos anos, no início desse fantástico processo chamado adolescência.
Diria mais, aquela pequena edição encontrou-me acidentalmente. Li as primeiras estrofes e não o consegui largar até terminar o poema. Lembro-me de me encostar à parede e pensar: - o que foi isto?

Foi o início do meu secreto fascínio pelo Álvaro de Campos, assim entrei paulatinamente no Universo Pessoniano. A curiosidade obrigou-me a consumir avidamente toda a sua obra. 

"Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim."

E foi isto, após ler tudo aquilo a realidade plausível caiu de repente sobre mim e a vida continua.

Igual? - Jamais!

"Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu."

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